Foto: Igo Bione/JC Imagem
|
Um pedido de desculpas e o perdão
não poderiam escolher lugar melhor para se encontrar. Um museu. Mais
especificamente o Museu de Arte Contemporânea (MAC) de Pernambuco, em Olinda,
um dos mais importantes da América Latina. O pedido partiu de um jovem
franzino, carioca de sotaque carregado, que há pouco mais de dois anos levou o
MAC a ganhar as manchetes dos principais jornais do Brasil e até mesmo do
exterior.
Leonardo Jorge da Silva, 26 anos,
acusado de furtar do local a tela Enterro, do pintor Cândido Portinari, em 14
de julho de 2010, voltou no fim da semana passada ao museu. Dessa vez, no
entanto, não buscava obras de arte. Estava atrás do perdão de Célia Labanca,
diretora do espaço.
Para ele, solto há um mês através
de decisão da Justiça para responder o processo em liberdade e que diz querer
retomar a vida longe do mundo do crime, o pedido de desculpas seria o primeiro
passo para o recomeço. O encontro aconteceu no fim da manhã de um dia chuvoso.
De um lado, Leonardo, ainda
tímido, que vestiu a melhor roupa para a visita. Por cima da camisa preta de
botão, a farda do Projeto Travessia, que o fez orador da primeira turma de
detentos a concluir o ensino médio no Presídio de Segurança Máxima de Igarassu,
no Grande Recife.
Do outro, na sala em anexo à
entrada principal do museu, uma ainda desconfiada Célia Labanca. Quem primeiro
falou foi ela, indagando logo se o jovem pretendia mudar de vida e avisando que
o ser humano é resultado de suas escolhas.
De cabeça baixa, Leonardo parecia
concordar com os puxões de orelha. Admitiu que fez a escolha errada e começou a
explicar a história da sua vida, que teve início no bairro de Ramos, no Rio de
Janeiro.
A partir daí, a conversa fluiu.
Célia se mostrou impressionada com a desenvoltura, educação e conhecimento em
arte do ladrão que tirou suas noites de sono naquele julho de 2010. Leonardo
assumiu o crime na frente da diretora e afirmou que pretende entrar em uma
faculdade e usar o que já aprendeu para voltar a ter uma vida digna.
Homossexual assumido, o jovem
disse ter decidido mudar de vida após entrar na escola. “Ainda na prisão,
comecei a fazer pesquisas para um próximo trabalho (furto). Mas vi na escola um
refúgio, pois sofri muito lá dentro, principalmente pela minha condição sexual.
E na escola percebi que posso usar meus conhecimentos para mudar de vida. Mas
antes tinha que pedir desculpas”, ressaltou Leonardo, que entregou a camisa do
Projeto Travessia e uma carta de sete páginas à Célia.
Para a diretora do museu, a
atitude do jovem é nobre. “Esse menino é inteligentíssimo. E deve usar essa
inteligência. Vejo que você é uma pessoa boa. Com todo o prazer, lhe perdoo”,
afirmou Célia, que presenteou Leonardo com dois livros escritos por ela.
A diretora ainda disse que vai
entrar em contato com a Chefia de Apoio a Egressos e Liberados do Estado,
colocou o museu à disposição do novo amigo e garantiu: “Vou mandar emoldurar a
camisa de Leonardo e colocá-la na sala dedicada a Cândido Portinari.”
Procurado pelo JC, o delegado
Manuel Martins, que prendeu o carioca lá no Rio de Janeiro, afirmou ter
percebido “algo diferente” no jovem. “Ele é uma pessoa diferenciada, muito
inteligente. Não dificultou a investigação, nos contou tudo.”
O quadro foi recuperado no dia 31
de julho de 2010, no Rio de Janeiro. Na ocasião, Leonardo Jorge foi preso junto
com o intermediador da venda, Leonardo Bispo da Silva.
Jornal do Commercio
Jornal do Commercio
Nenhum comentário:
Postar um comentário