Tecnologia e sociedade consumista
pode interferir nos desejos das crianças.
A difícil missão de dizer não aos
pequenos. No Dia das Crianças - e também em outras datas comemorativas ou não -
pais enfrentam essa tarefa dolorosa que é contrariar os desejos materiais dos
filhos. O sentimento de culpa pela ausência imposta com a rotina corrida e até
a vontade de integrá-lo à sociedade consumista faz com que muitos voltem atrás
na negativa. E assim começa um ciclo vicioso: pai tentando negar, filho
convencendo do contrário.
Antes de entender o porquê das
crianças pedirem tanto e não se contentarem com o oferecido, os pais precisam
compreender como cresce o desejo dos menores. "A criança começa a dizer o
que quer desde que nasce. A primeira comunicação é através do choro. O que
acontece é que ela responderá ao modelo familiar e aprenderá muito mais pelo
que os pais falam. A questão do consumismo passa, sobretudo, pela família.
Quando o pequeno nasce, aprende a ser como é no ambiente em que vive. Este é um
grande fortalecedor da construção da identidade do ser humano", ressalta a
psicóloga Adriana Barros.
DICAS PARA COMBATER O CONSUMISMO INFANTIL
» Faça um planejamento antes das
compras com a criança
» O pequeno não terá compreensão
deste planejamento. Por isso, o pai deve dar opções de escolha, gerando no
filho a noção de responsabilidade
» Conceder aos pequenos muita
liberdade de escolha deixa as crianças muito livres, mas elas não têm essa
maturidade
» Use o jogo da compreensão para que
a criança compreenda o perigo da inversão de valores. Os pais precisam mostrar
além dos produtos de 'marca' e 'qualidade', e mesclar os presentes
» Estimule a autoestima da criança.
A partir do momento que você reconhece a capacidade do pequeno, chama para a
responsabilidade que ele tem diante do mundo e das escolhas
» Cuidado com a super proteção.
"Educar é difícil porque os pais querem super proteger os filhos. Quando
eu super protejo um filho eu estou dizendo que ele é incapaz, que ele é
impossivel de fazer sozinho", alerta a especialista
Os valores vivenciados neste
ambiente precisam ser analisados e desconstruídos para depois serem praticados.
"Nem psicólogo, professor ou padre vão resolver os problemas. A família
tem que arregaçar as mangas. Tem que ter muito diálogo, disponibilidade, não se
desesperar e se mostrar presente. Na hora que os pais reconhecem que estão
errados (na questão dos valores), aí, sim, poderão dar limites", afirma a
especialista.
Quando os pais aprendem que limites
são muito mais que necessários, essenciais, outras barreiras se erguem. O
sentimento de culpa é uma delas. "Muitas vezes, por trabalharem tanto, os
pais sentem um pouco de culpa. Mas o que importa é dar aos filhos o
qualitativo: estar inteiro para eles nos dias e horários possíveis. Os pais
começam a dar presentes como forma de compensar, mas eles precisam ensinar às
crianças a lidar com o que têm."
"Limite é um ato de amor. No
momento que eu digo não a esta criança, eu estou protegendo ela".
A questão imposta pela sociedade de
que precisamos muito mais do que realmente precisamos também é determinante na
desorganização familiar. "Antigamente se valorizava o ser. Depois as
pessoas passaram a valorizar o ter. Atualmente, estão valorizando o 'faz de
conta que eu tenho'. Mas os pais não podem sair da realidade. Não podem
cultivar no filho os valores da facilidade e sim o da necessidade. O pequeno
precisa ir atrás", revela a psicóloga.
Para Flávia Pires, mãe de Laís, 11
anos, os valores da necessidade sempre foram colocados em prática. "Qual é
o pai que não quer atender o desejo do filho? Não é fácil dizer não. Mas a
gente precisa pensar no resultado a longo prazo para a formação da criança. Tem
que ter diálogo. A gente conversa bastante, é uma prática que temos desde que
Laís era pequena", comenta. Recentemente, a filha mostrou o interesse em
ganhar um tablet e Flávia não teve dúvida: lançou escolhas. "Ela queria um
tablet de presente e eu disse que ela precisaria abrir mão dos outros presentes
da família. Laís foi juntando e quando passou o mês do aniversário já tinha
quase 70% do valor", diz Flávia, orgulhosa. Como Laís queria uma marca
específica, precisou economizar ainda mais. "Ela tem noção que tem algo de
muito valioso nas mãos e passa a dar valor àquilo que conquistou",
defende.
Após o nascimento da filha, a
mercadóloga Nicole Silveira resolveu investir no consumo consciente. Com o
marido, o marceneiro Gleyton Leão, abriu uma loja de brinquedos baseados no
método Montessori (conjunto de práticas criada pela médica e educadora italiana
Maria Montessori para estabelecer o desenvolvimento educacional da criança).
"Não só combato o consumismo, como falo muito do consumo consciente. Os brinquedos
hoje são muito virtuais. Criam na criança aquela cultura de consumir sempre
mais, o que está na moda", comenta Nicole, que também é mãe da pequena
Hadassa, de 2 anos.
Deste então, a família aboliu a
televisão de casa e investe em experiências concretas. "As crianças têm
que ter algo de personagem. Mas esses personagens vão desaparecer um dia. A
gente sabe do apelo que a propaganda tem nos pequenos, estimulando um
consumismo negativo. Cultivamos nela atividades que despertem seu interesse.
Hadassa gosta de se sentir útil", comenta Nicole.
Todas as negativas, limites e
valores familiares precisam ser apresentados com muito cuidado ao universo
infantil. "Se há a capacidade do diálogo, temos que fazer uso dela. Até
porque as crianças insistem. O não deve ser explicado, deve ser conversado. Tem
que estar em sintonia entre pai e mãe. A família precisa passar por um processo
de reaprendizagem". Caso o diálogo desapareça da rotina, as consequências
serão graves: "A criança aprenderá que o amor pode ser comprado. E afeto
comprado é muito perigoso", defende Adriana.
NE10
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