Santander Cultural/ Divulgação
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O crítico Mário Pedrosa conta, em
um artigo publicado no catálogo da exposição, que a sociedade pernambucana não
estava preparada para a pintura de Cícero Dias (1907-2003). Quem encabeçou a
reação extremada foi, inclusive, um senhor que viraria nome de avenida: Mário
Melo.
“As famílias burguesas perderam o
sossego; homens sisudos e pequenos burgueses moralistas não compreendiam como é
que se havia aberto o salão nobre da Faculdade de Direito, tão vetusta, guardiã
das mais respeitáveis tradições, àquelas garatujas e monstros. Para a boa
gente, Cícero era um pernambucano endiabrado, que se perdera em Paris em más
companhias”, escreve Pedrosa. As pessoas queriam delimitações, determinações
rígidas. Como podia um pintor intitular uma tela Ou mamoeiro ou dançarino?
Tinha que ser uma coisa ou outra.
Logo na entrada da exposição, é a
pintura de Dias que se impõe. “Na grande pintura de Dias - realizada sobre
papel kraft, já indício de profanação do métier -, a luminosidade tropical se
transforma em clareza do enunciado e, assim, se o pretexto inicial da obra era
o de contar a história de Joaquim Nabuco, inevitavelmente metamorfoseou-se por
uma enxurrada de imagens do cotidiano”, escrevem os curadores.
O próprio Dias explicou: “Tudo se
mexia na minha cabeça. Imagens do começo da vida. Tantas coisas: mulheres,
histórias fantásticas, escada de Jacó, as 11 mil virgens. Levaria todas essas
imagens para dentro de um afresco?”.
Por conta dessa pintura, exposta
no chamado Salão Revolucionário, Mário de Andrade, que era próximo de Dias,
possuía dele treze obras, inclusive cartas ilustradas, reagiu. “Mário recalcou
a obra com silêncio tácito, pois nela pode ter percebido uma oposição a seu
projeto geopolítico, já que Dias configurava uma geografia excêntrica. Já em
1928, para o Mário ideológico, o problema de Cícero era não ser paulista, pois
lhe faltava ‘bandeirismo: o longe vago buscado’”.
Na exposição, há o Cícero Dias
das décadas de 1920 e 1930 e, na parede oposta, o da década de 1940. E ninguém
diria se tratar do mesmo pintor. No óleo sobre tela Sem título, de 1948, o
abstracionismo só não abocanhou o tronco do coqueiro, talvez a vara de bambu.
“Já há o movimento, os ritmos formais. Só que, na última, ele já não precisa de
um imaginário para falar que o ponto de partida dele é o Recife”, avalia o
pesquisador Paulo Herkenhoff, que fez a curadoria da exposição ao lado da
artista Clarissa Diniz.
Serviço
Zona Tórrida, certa pintura do
Nordeste
Quando: De terça a domingo, das
13h às 20h, até 20 de maio
Onde: Santander Cultural (Avenida
Rio Branco, 23, Bairro do Recife)
Quanto: Entrada franca
Informações: (81) 3224-1110
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