A ONU acusou nesta quarta-feira
(5) o Vaticano de violar a Convenção de Direitos da Criança, depois de publicar
um relatório muito crítico no qual exige que se denuncie à polícia todos os
casos de pedofilia dentro da Igreja.
Nas conclusões do relatório, o
Comitê convoca a Santa Sé a "afastar imediatamente de suas funções todos
os autores conhecidos e suspeitos de abusos sexuais de crianças, e denunciá-los
às autoridades competentes para que os investiguem e processem".
O relatório foi publicado após
uma audiência realizada no mês passado em Genebra, na qual membros do Comitê,
composto por 18 especialistas em direitos humanos de todo o mundo, interrogaram
uma delegação do Vaticano sobre sua política de luta contra a pedofilia.
Ao ser perguntada sobre se o
relatório acusa o Vaticano de violar a Convenção de Direitos da Criança da ONU
no que diz respeito aos abusos sexuais, a presidente do Comitê, Kirsten
Sandberg, respondeu: "A resposta é sim, até agora violaram a Convenção,
porque não fizeram tudo o que deveriam" para solucionar este problema.
No relatório, o Comitê afirma que
a Igreja Católica ainda não fez o suficiente para cumprir seu compromisso de
erradicar a pedofilia.
O Comitê da ONU destaca "sua
profunda inquietação pelos abusos sexuais cometidos contra crianças por membros
de igrejas católicas que pesam sob a autoridade da Santa Sé", e lembrou
que estes crimes cometidos por religiosos envolvem "dezenas de milhares de
crianças de todo o mundo".
"O Comitê está muito
preocupado pelo fato de a Santa Sé não ter reconhecido a amplitude dos crimes
cometidos, não ter tomado as medidas apropriadas para enfrentar os casos de
pedofilia e para proteger as crianças e por ter adotado políticas e práticas
que propiciaram o prosseguimento dos abusos e a impunidade dos autores",
acrescenta o texto.
Em resposta, o Vaticano prometeu
examinar minuciosamente as críticas da ONU de que não fez o necessário para
frear o problema da pedofilia dentro da Igreja.
Ao mesmo tempo, a Santa Sé
recebeu como ingerência alguns pontos do relatório relacionados aos
ensinamentos da Igreja em termos de métodos anticoncepcionais e o aborto.
MOBILIDADE DOS CRIMINOSOS - O
relatório das Nações Unidas critica, em particular, a política de trocar de
paróquia os sacerdotes pedófilos, uma prática que considera como uma tentativa
de acobertar os crimes e evitar que sejam julgados pelas autoridades civis.
"A prática da mobilidade dos
criminosos, que permitiu que muitos sacerdotes permaneçam em contato com
crianças e continuem abusando delas, continua expondo crianças de muitos países
a um alto risco de sofrer abusos sexuais", escreve o relatório.
Assim como outros signatários da
Convenção da ONU dos Direitos da Criança em 1989, o Vaticano está submetido à
vigilância do Comitê. Sua presença no mês passado na audiência foi a primeira
desde a explosão do escândalo de abusos sexuais em muitos países, da Europa,
América Latina e Estados Unidos.
Desde 2001, os casos de pedofilia
cometidos no seio da Igreja foram tratados de forma interna pela Congregação
para a Doutrina da Fé, o equivalente de um ministério da Justiça no Vaticano.
O Comitê da ONU se queixa de não
ter recebido dados de todos os casos de pedofilia estudados pela Congregação,
nem sobre as punições aplicadas.
Além disso, criticou o recurso a
"medidas disciplinares que permitiram à grande maioria de autores e a
quase todos os que acobertaram abusos de crianças escapar à justiça dos países
onde estes crimes foram cometidos".
O Comitê criticou especialmente o
"código de silêncio" imposto ao clero sob ameaça de excomunhão.
Bento XVI, papa de 2005 a 2013,
foi o primeiro a se desculpar pelos abusos cometidos contra menores, e propôs
uma política de tolerância zero, que, segundo seus críticos, não foi
acompanhada por todas as medidas necessárias para eliminar o problema.
Seu sucessor, Francisco, disse
que a pedofilia no seio da Igreja é uma vergonha e em dezembro criou uma
comissão para investigar estes crimes, preveni-los e atender as vítimas.
O Comitê da ONU deu as
boas-vindas à iniciativa, afirmando, no entanto, que ela não vai longe o
suficiente e que a Santa Sé deveria criar um organismo independente de direitos
humanos para se ocupar da questão.
Também declarou que os arquivos
da Igreja deveriam ser abertos para que os culpados de pedofilia e seus
cúmplices sejam responsabilizados.
Fonte: AFP
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