domingo, 25 de março de 2012

ENTREVISTA: HELOÍSA HELENA (PSOL) VEREADORA DE MACEIÓ/AL

Do Folhape
imagem: tribunahoje.com

“É o melhor dos mundos para a esperteza política”. Afastada do parlamento nacional, como senadora da república pelo PT de Alagoas, desde 2002, a vereadora de Maceió pelo PSOL, Heloísa Helena - que também já ocupou um assento na Câmara Federal e tentou a vaga de presidente em 2006 - ficou famosa por tecer duras críticas e fazer denúncias de corrupção contra o Governo Lula, de quem foi aliada durante 13 anos.

Por desobedecer a cartilha do PT, cujo estopim foi em 2003, quando se recusou a aprovar a condução de Henrique Meirelles à presidência do Banco Central, Heloísa foi desligada do partido de Lula. Hoje, diante de todos os problemas enfrentados pelo Governo Dilma Rousseff, como a queda de ministros e as desavenças e rompimentos com partidos da base aliada, a vereadora atribui a atual gestão petista a culpa quanto à falta de compromisso com a população, a má condução da política econômica e a impunidade aos ministros que caíram sob suspeita de corrupção.

Nesta entrevista, ela também compara as administrações de Lula e Dilma à de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e fala sobre seu desejo de apoiar os planos da ex-ministra e ex- senadora Marina Silva de formar um novo partido.

Essa confusão entre os partidos da base aliada, que disputam cargos e maior poder no Governo, pode ocasionar o enfraquecimento e desgaste da gestão petista?
Compreendo que o poder revela a personalidade e o caráter das pessoas. Eu tive oportunidade de conviver com muitas pessoas e, independente de se posicionarem de esquerda ou de direita, o poder não as mudou. Então, o poder não muda ninguém. Apenas as revela, seja no banditismo político ou na dignidade das lutas honradas independente das convicções ideológicas que as motivem. O problema é que esse jogo de interesse, de alguma forma, incomoda a população. É o que chamamos de banditismo político, apresentado dia após dia. Um dia acontece na área de saúde, no outro dia se vê o roubo da merenda escolar para comprar uísque. E assim vai.



Desde o ano passado, a presidente Dilma Rousseff vem enfrentando crises no seu Governo com a queda de ministros, rebeliões de partidos aliados, além de críticas ferrenhas da oposição. Como a senhora enxerga essa situação?
Eu, sinceramente, não vejo isso como um exemplo de democracia. Principalmente por  se tratar de um governo que só tem a iniciativa de retirar ou afastar um ministro acusado por corrupção - que todos já sabiam que ele era vinculado ao banditismo político -, depois que a mídia faz a denúncia. Não enxergo isso como um ato sério, já que, diante de um crime cometido contra a administração pública, o Governo sequer permite ou instala um procedimento investigatório. Isso se traduz em um jogo fantástico, inteligente, mas cínico e dissimulado de pôr para os velhos esgotos da política aqueles que parasitam as instâncias de decisão. Mas a prova de que isso tudo é jogo de cena, é que essas mesmas personalidades (ministros), as quais não são submetidas a nenhum processo investigatório, continuam intervindo na vida pública, definindo quem são seus substitutos, e as relações promíscuas continuam existindo. É um jogo de cena típico da real politiquê, mas que em nada muda na espinha dorsal da partilha das estruturas de poder.


A senhora falou sobre o “carinho” com o qual a presidente Dilma trata algumas personalidades políticas em troca de favores que beneficiem seu Governo.
Desconfio que exista uma única pessoa de bom senso que não saiba exatamente quem são essas personalidades politicas que são tratadas com ‘amor’ (digo em tom de ironia, é óbvio) e respeito, seja com qualquer um dos partidos, como alguns alagoanos, por exemplo, (se referindo a Fernando Collor-PTB e Renan Calheiros -PMDB). Inclusive, quem não sabe a forma que Lula e Dilma os trata como companheiros? Quem não sabe também que a partilha do poder político é dessas personalidades? Quando cai um ministro, pergunta aqui em Pernambuco, em Alagoas ou em qualquer outro estado quem são os indicados para ocupar as instâncias de decisão política e os espaços de poder? São pessoas indicadas pela competência técnica? Não. O que se aplica é a velha fórmula da composição de bases bajulatórias, onde se distribui cargos, prestígios, liberação de emenda, propinório e poder para não ter que enfrentar o processo mais difícil, que é despertar no imaginário popular o espírito de uma sociedade emancipada. Até entendo que o melhor para essas personalidades é comprar parlamentares para que eles não possam fiscalizar seus trabalhos. Esse é o melhor dos mundos para a esperteza política. Isso é bom para o gestor, que não verá a tarefa mais nobre do Legislativo existir, que a questão da fiscalização, monitoramento e controle. É um reino podre, onde todos reinam igualmente sem nenhum problema.


Como a senhora avalia a condução das políticas econômicas no Brasil e a relação do País no que se refere aos interesses comerciais das grandes nações?
Entendo que tanto a Era FHC como, também, na Era Lula, o Brasil se insere na globalização capitalista de forma subserviente aos interesses comerciais das grandes nações e aos interesses do parasitismo político do capital financeiro. Essa falha e exemplo de má gestão econômica impacta diretamente na vida da população, seja nos problemas de saúde pública, na segurança, na creche do bairro ou na favela que se instala. Isso porque a concepção da partilha de riquezas construída nacionalmente é que define as políticas públicas e sociais, que deveria beneficiar a população. Enquanto isso, o que se faz é jogar cerca de 70% do orçamento nacional para viabilizar pagamentos de juros e serviços divida externa, superávit, contigência orçamentária, cortes nos orçamentos que deveriam ser destinados à melhoria da qualidade de vida dos brasileiros. Isso não é um discurso socialista, entende? É uma questão lógica.


Qual tem sido seu papel dentro do PSOL e como andam as conversas dentro do partido sobre a possibilidade de apoiar Marina Silva em seus projetos políticos?
Hoje, não faço parte de nenhuma das instâncias do partido em função da contenda do processo da eleição de Marina. Quero ter a liberdade democrática de ajudar a Marina se ela entender que seja necessário construir um espaço partidário. Como foi criada uma contenda grande no PSOL de ameaçar expulsar quem ajudasse Marina a constrir um novo partido, então aceitei o desafio. Se alguém acha que pode, pela pressão, política me fazer desistir de uma causa que eu entenda ser nobre, tire o cavalo da chuva porque ele morrerá de pneumonia. Por este motivo, estamos discutindo, dentro da estrutura partidária, que, do mesmo jeito que o povo brasileiro foi extremamente generoso conosco, nos ajudando a construir um novo partido. Por que não apoiar Marina? Hoje, a maioria dos membros que constitui o PSOL não é fundadora. Muitos, na época, estavam no PT, PSTU e outros. Muitos, inclusive, trabalhando contra a fundação do PSOL, e nós fomos capazes de acolhê-los. Diante disso, acho absolutamente justo e legítimo apoiar Marina na construção desse novo projeto que poderá culminar ou não com a nossa estrutura partidária.


Qual a chave para atender os anseios da população brasileira e, ao mesmo tempo, viabilizar apoio político para desempenhar uma boa gestão?
Os projetos de infraestrutura, arranjos produtivos locais, os mecanismos na saúde, educação, segurança pública que podem garantir a melhoria das condições materiais de existência, devem assuntos prioritários para que depois possamos pensar nos grandes projetos de emancipação humana. Sempre acho que esse é o grande desafio dos socialistas. Respeito quem acha que vai vivenciar uma sociedade plenamente socialista, mas eu não acredito. Mesmo assim, eu quero ter a consciência de que dediquei os minutos da minha vida para que uma outra sociedade possa vivenciar essa experiência preciosa e sublime: garantir as condições materiais de existência digna para que as pessoas possam pensar numa sociedade mais elevada do ponto de vista civilizatório e humano. Discutir essa questão no processo eleitoral, é uma experiência que, infelizmente, nossa tradição da militância de esquerda às vezes despreza. Evitam falar sobre esses mecanismos com as populações locais em relação à melhoria objetiva e concreta, da necessidade de superar esse abismo entre o que foi conquistado na legislação mais avançada do planeta e a realidade objetiva de vida da população.

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