segunda-feira, 25 de março de 2013

Empregado em casa será artigo de luxo no Brasil


Aprovação da PEC que estende à categoria benefícios como FGTS, hora-extra e adicional noturno está prevista para ocorrer amanhã. Custo vai subir para garantir novos direitos

Dada como certa a aprovação em segundo turno pelo Senado Federal, prevista para ocorrer amanhã, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 66/2012 , conhecida como PEC das Domésticas, que amplia à categoria direitos previstos em lei para outros trabalhadores, deverá mudar as relações de trabalho em boa parte das residências brasileiras. Patrões e empregados estão às voltas com dúvidas sobre como colocar em prática medidas que, devido às especificidades do trabalho doméstico, trarão desafios para serem controlados e conduzidos. O aumento do custo para manter um trabalhador do lar é a maior preocupação dos patrões, principalmente para aqueles que precisam do funcionário para dormir. Levando em conta o salário de R$ 1,5 mil, sem obrigações como INSS e vale-transporte, o aumento para o empregador seria de R$ 620,88, ou 41% a mais. Já incluindo todos os custos, em algumas situações, o peso no orçamento pode aumentar até 33,6%.

Este é o caso das domésticas com salário de R$ 1,5 mil. Antes da aprovação da PEC, o custo mensal, sem provisões, para os empregadores é de R$ 1.846,99. Com a aprovação das novas regras e levando em conta a necessidade de o patrão pagar duas horas-extras diária, o custo sobe para R$ 2.467,87, quase 34% a mais. Para quem não precisa pagar por hora-extra e no caso de a doméstica ter um salário menor – R$ 1 mil –, o peso no bolso é mais suave: 6,96% (veja quadro). Entretanto, em ambos exemplos, a elevação das custos supera a inflação oficial do país (IPCA), que fechou 2012 com alta de 5,84%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Para especialistas em direito do trabalho, a PEC representa um avanço na garantia de direitos dos trabalhadores domésticos, mas prevê situações que precisam ser regulamentadas para que não se tornem problemas para ambos os lados. A categoria – que reúne cerca de 7 milhões de brasileiros, dentre eles somente 2 milhões com carteira assinada – passa a ter assegurados 16 benefícios já previstos aos demais trabalhadores brasileiros contratados pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), entre eles o recolhimento obrigatório do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o cumprimento de jornadas de oito horas diárias e 44 horas semanais, e o pagamento de hora-extra e adicional noturno.
 A PEC das Domésticas beneficiará qualquer trabalhador contratado para realizar atividades em ambiente residencial, ao menos três dias por semana. Entre esses trabalhadores, há os que residem no local do emprego e outros que dormem de segunda a sexta-feira. Atualmente, a legislação prevê que o trabalho noturno é o realizado entre 22h e 5h. Para advogados, o horário de descanso não deverá ser considerado como adicional noturno, a menos que os trabalhadores sejam solicitados, mas esse controle promete ser uma verdadeira dor de cabeça.

Marcos Castro Baptista de Oliveira, advogado especializado em direito do trabalho, sugere que patrões e empregados passem a anotar os horários referentes à jornada de trabalho, mesmo que essa não seja uma obrigação legal. Além disso, assinar um novo contrato com previsão dos horários e seguí-lo à risca será fundamental. “De qualquer forma, o impacto financeiro será muito grande”, diz. A ideia das anotações é compartilhada pelo também advogado Alexandre de Almeida Gonçalves, especialista em direito empresarial e concorrencial. “Lembra dos caderninhos usados nas antigas mercearias? Patrão e empregado deverão preenchê-lo diariamente com os horários de início e término da jornada. Os dois assinam e essa prova dará mais segurança jurídica a ambos os lados”.


Jurisprudência

Outro ponto específico da atividade doméstica e que pode gerar polêmica é em relação ao horário de almoço. “A pausa terá que ser feita um pouco mais cedo ou mais tarde”, diz a doutora em direito do trabalho Joselita Borba. Para ela, as definições da jornada de trabalho e quem mora na residência dos patrões, vão acabar na Justiça. “Não há como controlar as horas de trabalho desse profissional. A jurisprudência vai ter que lidar com essas questões específicas, ou seja, as decisões judiciais que se repetem e acabam por consolidar uma situação.” O advogado Alexandre Gonçalves lembra que a Lei 11.324/2006 não permite descontar alimentação, itens de higiene, vestuário e moradia dos empregados domésticos.
Com muitas dúvidas sobre as novas regra e três filhos pequenos, a administradora Sherley Inácio Ferreira conta que a sua empregada pediu demissão e, mesmo assim, ela também preferiu dispensar a babá, que cumpre aviso-prévio, e colocar as crianças na escola. Vai esperar até que as novas regras sejam consolidadas para definir se contrata ou não uma diarista. “Estou insegura, sempre procurei fazer tudo certinho, mas não sei como fazer um controle de jornada de trabalho, como comprovar os horários. Prefiro não ter essa dor de cabeça. Acho que só vai compensar manter uma empregada doméstica para quem realmente tem dinheiro.”

Por outro lado, domésticas também estão receosas. A diarista Elaine Jesus diz que não foi contratada como doméstica justamente por causa das novas regras. “Tinha uma pessoa interessada em me contratar como fixa, mas depois que soube da possibilidade de a PEC ser aprovada, voltou atrás.” Já a babá Dina Coelho acredita que a aprovação da PEC pode estimular ainda mais o aumento da informalidade. “Com certeza é justo (a aprovação), mas há o medo de como isso vai ser colocado em prática. Talvez poderia ter uma carga horária mais flexível. Hora extra e adicional noturno são o que vão pegar mais.”

Do estado de Minas


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