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Atletas de ambos os sexos foram monitorados com um sistema de multicâmeras. Arte: Andersin Araújo/ CB/ D A Press |
As mulheres podem jogar futebol
tão bem quanto os homens, embora os dois sexos tenham estilos diferentes de
praticar o esporte. É o que mostra um estudo liderado por Julen Castellano,
pesquisador da Faculdade de Atividade Física e Ciências do Desporto da
Universidade do País Basco, em colaboração com especialistas de outras
instituições europeias.
O cientista comparou o desempenho físico e técnico de
atletas masculinos e femininos, concluindo que, apesar de o primeiro grupo
apresentar uma performance física melhor — como já era esperado —, as boleiras
não devem nada em relação à performance técnica. O trabalho foi divulgado
recentemente na revista científica 'Human Movement Science'.
Castellano e colegas coordenaram
um longo e minucioso monitoramento de 113 jogadores profissionais (59 mulheres
e 54 homens) durante a Champions League, campeonato organizado pela União das
Federações Europeias de Futebol (Uefa). A técnica utilizada foi capaz de
acompanhar os movimentos e o desempenho dos atletas nos 90 minutos de partida.
Os resultados mostram que, de
maneira geral, em todas as posições, os homens percorrem uma distância muito
maior durante as partidas. As mulheres, por sua vez, parecem jogar com níveis
de intensidade mais elevadas. Em razão disso, elas apresentaram um cansaço
maior no segundo tempo, tendo queda de rendimento. Nenhuma diferença
significativa, contudo, foi encontrada quando se analisou questões técnicas,
como número de passes, tempo de posse de bola e total de duelos ganhos.
O líder da pesquisa acredita que
uma das aplicações práticas do estudo, a curto prazo, pode ser a adaptação da
preparação física e técnica para cada sexo, de acordo com seu desempenho, com o
objetivo de tornar a prática do esporte ainda mais dinâmica. Ele considera que,
quando valores absolutos são usados como critério de referência para a
comparação, “é possível cometer um erro ao subestimar o esforço feito pelo sexo
feminino”.
O futebol feminino, diz, não deve ser apenas “um espelho do alto
desempenho do futebol masculino” e não deve tentar alcançar a velocidade, a
intensidade ou a distância percorrida pelos homens. “Se ambos os sexos estão
jogando o mesmo jogo, cada um deve fazer isso à sua maneira.”
Aprendizagem
Segundo o coordenador do Programa
de Pós-Graduação em Ciências do Movimento Humano da Universidade Federal do Rio
Grande Sul (UFRGS), Flávio Antônio de Souza Castro, diferenças de força,
potência, resistência e velocidade são esperadas, devido a peculiaridades
antropométricas, principalmente maior percentual de massa muscular e menor de
gordura nos homens. “A técnica não depende, exclusivamente, das características
fisiológicas já apontadas, mas também dos processos de aprendizagem motora”,
explica Castro, também vice-diretor da Escola de Educação Física da UFRGS.
Para ele, quando a técnica é desenvolvida
desde cedo, com processos adequados, é possível que, guardadas as diferenças de
força, homens e mulheres possam ter desempenhos técnicos similares. Até se
tornarem maduros, há poucas distinções fisiológicas entre meninos e meninas,
que se acentuam a partir do amadurecimento.
Castro considera surpreendente a
escassez de estudos desse tipo, já que a Europa e os Estados Unidos possuem
muitos times e boa tradição no futebol feminino, praticado desde a fase escolar
pelas garotas. Ele acrescenta que, no Brasil, características nacionais
relativas ao preconceito de gênero contribuem para a menor visibilidade da
prática pelas mulheres. “Ainda há muito preconceito em relação ao futebol
feminino. Cabe aos educadores, aos órgãos de organização e de controle e à
mídia trabalhar para que esse preconceito acabe.”
Vídeo
Foi utilizada uma técnica de
localização de vídeo que reconhece cada jogador e o monitora a uma velocidade
de 25 vezes por segundo. Dessa forma, os cientistas sabem onde o atleta está a
cada instante da partida e podem contabilizar uma série de dados, como
distâncias percorridas, velocidade alcançada e toques na bola. Esse método e
outros semelhantes são cada vez mais utilizados por equipes profissionais. Esse
tipo de estudo tem provocado mudanças no esporte, mostrando, por exemplo, que
times que correm distâncias menores (logo tocam mais a bola) costumam se sair
melhor nas competições.
Evolução no jogo
“A melhor performance física dos
homens já era esperada. Entretanto, eles não encontraram diferenças na técnica
de jogo, o que confirma a grande evolução do futebol feminino nas últimas
décadas. Já sabemos que os homens possuem capacidade aeróbica e anaeróbica
superior à da mulher. Isso acontece por diferenças fisiológicas. Não podemos
ignorar a questão da habilidade. Se uma garota que é excelente jogadora compete
com garotos que não têm habilidade desenvolvida, esses casos ficam mais
evidentes.
O estudo tentou equalizar essas diferenças ao observar jogos da liga
europeia. Não entendo ser necessário diferenciar as regras do futebol para
homens e mulheres, devido à evolução já alcançada pelo futebol feminino. Muitas
pessoas acabam preferindo ver partidas de futebol feminino. É um jogo mais
cadenciado, em que a habilidade, muitas vezes, é mais importante que a força
física. Isso ficou comprovado no estudo.”
Diario de Pernambuco
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