Uma corrente de especialistas acredita que muitas crianças estão recebendo o diagnóstico de autismo muito cedo, quando ainda estão se desenvolvendo (Foto: Free Images) |
Neste Dia Mundial da Conscientização
do Autismo (2/4), vale recordar que, em 2011, o Journal of Pediatrics,
periódico científico internacional que apresenta pesquisas relacionadas à saúde
na infância, publicou um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade da
Califórnia, em San Diego (EUA), com destaque para um simples questionário que,
segundo os autores do trabalho, pode ajudar a diagnosticar o autismo em
crianças de apenas 1 ano. A lista de perguntas analisa a forma com que o bebê
lida com aspectos da comunicação (olhares, sons e gestos).
Em medicina, o diagnóstico
precoce é considerado muito importante quando vem à tona a maioria das doenças.
A questão que intriga, no caso da aceleração da detecção do autismo (transtorno
invasivo do desenvolvimento que acomete 2 milhões de brasileiros), é a
possibilidade de estarmos vivendo um período de inflação diagnóstica dessa
síndrome. “Esse superdiagnóstico causa muitos danos, inclusive na infância.
Percebemos que existe uma tendência da prática diagnóstica estar banalizada.
Muitas crianças estão recebendo o diagnóstico de autismo muito cedo, quando
ainda estão se desenvolvendo”, diz a psicóloga e psicanalista Valéria Aguiar,
membro da Rede Nacional Primeira Infância (RNPI) e do Espaço CPPL, no Recife.
Essa questão levantada pela
especialista anuncia um caloroso debate. De um lado, há quem defenda que o
diagnóstico mais rápido do autismo aumenta a eficácia do tratamento. Outra
corrente acredita que, mesmo diante de uma criança com sinais do transtorno, é
preciso aguardar um pouco para se fechar um cenário conclusivo. “Nessa espera,
não significa que vamos ficar de braços cruzados. Reconhecemos esses sinais que
podem comprometer o desenvolvimento infantil e, assim, oferecemos cuidados
imediatos às crianças e às famílias, mas sem criar rótulos imediatistas”,
complementa Valéria.
O Centro de Controle e Prevenção
de Doenças (CDC, na sigla em inglês), nos Estados Unidos, estima que atualmente
uma, em cada 68 crianças, apresenta transtorno do espectro autista. Se
considerarmos que, entre 2000 e 2012, o CDC estimou que, entre 2000 e 2012, a
estimativa era de uma para 150 crianças, houve um aumento de 120% da incidência
do transtorno. “Segundo esses dados, estaríamos enfrentando uma epidemia de
autismo”, critica a psicóloga e psicanalista Ana Elizabeth Cavalcanti, também
do Espaço CPPL.
Uma leva de especialistas defende
que esses números crescem a cada dia porque só agora se sabe diagnosticar o
autismo. “É o efeito de uma prática diagnóstica hegemônica que não leva em
consideração o contexto psicossocial de sintomas que podem indicar autismo e
tendem a representar comportamentos próprios da infância e outros que também
podem ser encontrados nas mais diferentes condições psíquicas das crianças”,
explica Ana Elizabeth.
Alguns sinais, isoladamente, não indicam necessariamente risco de autismo (Foto: Reprodução/Internet) |
Para ela, andar nas pontas dos
pés, gostar de girar objetos ou o próprio corpo, falar na terceira pessoa, ter
seletividade alimentar e crises de fúria intensas são hábitos encontrados no
desenvolvimento habitual das crianças. “E mesmo a evitação do olhar, o
embotamento afetivo, o isolamento, a baixa tolerância à frustração e o
repertório restrito de interesses podem ser encontrados nas mais diferentes
situações de dificuldades enfrentadas pela criança. Por si só, eles não são e
nem indicam, necessariamente, risco de autismo. Muito menos, são suficientes
para diagnosticá-lo”, frisa Ana Elizabeth.
Nesse contexto, a psicóloga também
alerta para a importância da relação dos pais com a criança. Em muitos casos de
diagnóstico de autismo, o rótulo passa a ser uma influência negativa. “Não
foram poucas as vezes em que presenciamos pais surpresos ao notarem que seus
filhos brincavam conosco e se davam conta de que não brincavam com eles porque
não acreditavam que pessoas com autismo eram capazes de brincar”, completa a
psicóloga.
Vale frisar que, em qualquer
idade, é possível perceber que algo não vai bem com as crianças, seja do ponto
de vista físico ou psíquico. Mas isso não significa que seja possível
determinar quadros psicopatológicos definidos, como o autismo. Como a criança é
um ser em pleno amadurecimento ou constituição neurofisiológica e psíquica, é
preciso identificar esses sintomas como sinais de alerta de que algo não vai
bem, mas que pode ser parcial ou totalmente superado com a ajuda adequada.
Esses sinais podem surgir em determinadas etapas do desenvolvimento normal das
crianças, como podem também significar diferentes transtornos, não somente o
que se conhece como autismo.
Blog Casa Saudável
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