Brasília – O Brasil criou e vai produzir a vacina contra esquistossomose, doença crônica causada pelo parasita Schistosoma encontrado em áreas sem saneamento básico. A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgou hoje (12), no Rio de Janeiro, os resultados dos testes clínicos de segurança da vacina desenvolvida pelo Laboratório Esquistossomose Experimental do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).
A descoberta é, na avaliação da
Fiocruz, um grande feito dos cientistas brasileiros, uma vez que a doença afeta
200 milhões de pessoas em áreas pobres e tem potencial para atingir um universo
de 800 milhões de pessoas expostas aos riscos de contágio no Brasil
(principalmente no Nordeste e em Minas Gerais), nos países africanos e na
América Central.
A esquistossomose é considerada
pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como a segunda doença parasitária mais
devastadora, atrás apenas da malária. “É uma doença dos países pobres,
associada à miséria”, resume Miriam Tendler, chefe do Laboratório
Esquistossomose Experimental em entrevista à Agência Brasil. Ela calcula que,
no prazo máximo de cinco anos, seja possível imunizar a população dos locais
onde ocorre a endemia.
O anúncio feito no Rio é relativo
à fase de testes de segurança e eficácia da vacina - exigidos antes da
liberação para produção em grande escala. Vinte voluntários participaram dos
testes no Brasil que confirmaram a segurança da vacina, cuja eficiência já
havia sido comprovada em laboratório com mamíferos.
“A gente tem informações
associadas à eficácia que são a imunogenicidade. Ela induziu uma excelente
resposta imunológica, que é o que queremos dos indivíduos vacinados”, disse
Miriam Tendler.
Segundo a pesquisadora, além de
eficiente, “é uma vacina segura”. Para ela, “essa segurança é o maior atributo
de uma vacina. Só a partir da confirmação da segurança é que se pode fazer
testes em mais larga escala”, explicou. Os testes em larga escala serão feitos
no Brasil e na África.
As pesquisas para produção da
vacina contra esquistossomose tiveram início em 1975 na Fundação Osvaldo Cruz.
Na primeira década de pesquisas, os cientistas brasileiros conseguiram
identificar o princípio ativo que poderia exercer efeito farmacológico contra o
parasita. Na segunda década de trabalho foi identificada a proteína (S14), também
presente em outros parasitas. Essa constatação dá a possibilidade de se
produzir uma vacina polivalente – ou seja, que serve para a prevenção de outras
doenças parasitárias, inclusive aquelas que atingem gado de corte.
Na década de 1990, o Brasil deposita
a primeira patente com as descobertas e nos anos 2000, por meio de parceria
público privada (PPP) e com apoio da Financiadora de Projetos (Finep) cria-se
um modelo de negócio que permitiu a industrialização da vacina cuja segurança
foi anunciada hoje.
Miriam Tendler calcula que os
resultados já poderiam ter sido obtidos há dez anos e atribui a longa
trajetória da pesquisa a problemas de descontinuidade de financiamento e de
arranjo institucional. “Para você efetivamente fazer um produto de dentro de
uma instituição acadêmica é uma coisa muito complexa e complicada. Então as
parcerias [PPP, possíveis após a Lei nº 11.079/2004] são fundamentais.” A
pesquisadora não sabe quanto custou o desenvolvimento da vacina ao longo de
mais de três décadas.
A esquistossomose (também
conhecida no meio científico como bilharzíase) é causada por seis espécies do
parasita Schistosoma. O ciclo típico da doença tem início com a contaminação da
água por fezes humanas infectadas com ovos do parasita transformados em miracídios
(larvas). Essas larvas contagiam caramujos, se multiplicam, voltam à água e
infectam as pessoas pela pele.
As pessoas contaminadas podem
sentir dores de cabeça, fraqueza, falta de ar, dor abdominal, diarreia e tosse
com sangue. A doença pode afetar o fígado, os rins, a bexiga, os pulmões, a
medula e o cérebro e levar à morte. O tratamento é feito com medicamentos
antiparasitários. Mesmo após o tratamento é possível nova contaminação.
Agência Brasil
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