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Peças
de teatro, romances, novelas, contos e crônicas. Se existiu um escritor
brasileiro cujo talento, versatilidade e genialidade conseguiram despontar em
estilos tão distintos foi Nelson Rodrigues. Sua biografia é tão rica, que
parece reunir as histórias de muitas vidas.
Nascido
no Recife, em 23 de agosto de 1912, Nelson Falcão Rodrigues foi o quinto filho
de uma família de catorze. A cidade, na época, passava por um período de
intensas lutas entre grupos políticos, que levaram o pai, Mário Rodrigues, em
1915, a tentar a sorte no Rio de Janeiro, então capital da República. Não
demorou muito para a mãe de Nelson, Maria Esther, empenhar as joias, enviar um
telegrama para o marido e tomar um navio em 1916 para ir ao encontro dele com
os seis filhos.
O
pai de Nelson podia ser considerado um superdotado. Aprendera a ler e a
escrever ainda muito pequeno e aos cinco anos já tinha fascinação por jornal,
que lia com desenvoltura, o que o direcionou para a carreira de jornalista,
profissão que marcou a trajetória dos filhos. O primeiro emprego de Mário na
área foi no jornal “Correio da Manhã”, em 1916. Isso possibilitou à família
fixar-se no bairro de Aldeia Campista, na zona norte.
O
bairro serviu para que Nelson começasse o exercício de observação dos
personagens que lhe acompanharia como escritor até os últimos dias, ajudando-o
a compor suas histórias da vida real, com desfechos trágicos e chocantes em sua
grande maioria.
Precoce
em muitos aspectos e sempre contestador, Nelson já era apaixonado pelo futebol
(ou melhor, pelo Fluminense) aos 7 anos de idade, fumante aos 11 e jornalista
aos 13, quando começou a carreira em 1925, no jornal “A Manhã”, fundado pelo
próprio pai.
Em
1928, já era colunista. Dificilmente os leitores conseguiriam adivinhar a idade
do autor dos textos da página 3 do jornal, tamanha a maturidade do material
produzido, do alto dos seus 15 anos. No ano seguinte, Mário Rodrigues perdeu o
jornal para o sócio, em razão de dívidas, e apenas 49 dias depois lançou um
novo diário, o “Crítica”.
Um
jornal malcriado, cujo sucesso estrondoso acabou causando uma tragédia em
família. Em 1929, o jornal publicou uma reportagem sobre a separação de uma
mulher da alta sociedade, Sylvia Seraphim, que teria sido motivado por
adultério. A protagonista da reportagem foi até a redação do “Crítica”, com a
intenção de tirar satisfações com Mário Rodrigues ou Mário Rodrigues Filho. Na
época, Milton, Mário Filho, Nelson e Joffre apuravam as notícias e Roberto
Rodrigues cuidava das ilustrações. Foi recebida justamente por este, que tinha
enorme talento para o desenho. Um tiro no abdome derrubou-o. Mesmo tendo sido
socorrido logo, morreu três dias depois, aos 23 anos. Nelson presenciou tudo,
com apenas 17 anos.
O
assassinato de Roberto marcou profundamente a trajetória da família.
Inconformado por seu filho ter sido morto em seu lugar, Mário Rodrigues passou
a exagerar na bebida. Não bastasse isso, 67 dias depois, morreu vítima de uma
trombose cerebral aos 44 anos.
Milton
e Mário Filho assumiram o jornal. Com a vitória de Getúlio Vargas, o “Crítica”
foi fechado pela polícia, por ordens do governo, em plena Revolução de 30. O
começo da década de 30 não foi fácil para a família Rodrigues. A mulher que
matou Roberto foi absolvida (mas cometeu suicídio pouco tempo depois). A
redação do jornal foi totalmente destruída. A família passou necessidades
financeiras. Nelson contraiu tuberculose e perdeu o seu irmão mais querido,
Joffre, aos 21 anos, também devido à doença.
Em
1936, ano da morte de Joffre, Mário Filho havia se tornado sócio do “Jornal dos
Sports” e Nelson passou a fazer contribuições sobre futebol. Daí para frente,
escreveu em diversos veículos importantes como o “Correio da Manhã”, “O
Jornal”, “Última Hora”, “Manchete Esportiva”, “Jornal do Brasil”, “O Globo”,
entre outros. Escrevia crônicas, contos, folhetins, textos esportivos e artigos
com uma rapidez impressionante.
Em
1940, aos 40 anos, casa-se com Elza, mesmo em um período financeiramente
difícil. O teatro surge na vida de Nelson no ano seguinte, como uma alternativa
para ganhar dinheiro. Em 1942 finalmente estreia “A Mulher Sem Pecado”, sem
muito alarde.
Na
sequência, Nelson escreve a audaciosa “Vestido de Noiva”, uma das peças mais
encenadas do teatro brasileiro moderno, surpreendendo público e crítica. O
enredo ia para frente e para trás, a iluminação era delirante e o cenário era
simples, mas impactante. Por conta do sucesso, o ano de 1944 foi para Nelson
Rodrigues “inteiro de domingos”.
A
terceira peça, “Álbum de família”, que escandalizou o público ao falar de
incesto, em 1946. Foi interditada pelo governo até 1967, quando pôde ser
encenada pela primeira vez. “Anjo Negro”, de 1948, prometia mais abominações e
tinha um protagonista negro que contracenava com uma loira, escândalo para a
época. A saída para viabilizar a peça foi cênica: um ator branco, pintado de
preto. A peça foi um sucesso e permitiu a Nelson comprar uma casa e sair do
aluguel.
Versátil,
Nelson Rodrigues também construiu sua história na televisão brasileira. Foi
pioneiro na teledramaturgia ao escrever para a TV Rio a novela “A Morta Sem
Espelho”. Muitas de suas obras foram adaptadas para a TV, como “A Vida como ela
é...”, e outras para o cinema, como “Bonitinha, mas Ordinária” (que teve 2
milhões de espectadores em 1963), “Asfalto Selvagem”, “Anjo Negro”, “Toda Nudez
será Castigada”, “A Dama do Lotação” e “O Casamento”.
A
tuberculose devastou a saúde de Nelson Rodrigues na juventude e deixou sequelas
na maturidade, como uma bronquite crônica. Somava-se a isso uma lesão na aorta
abdominal, que em 1974 o levou para a cirurgia e em 1977 para a internação. Em
1979, mesmo debilitado, escreveu sua última peça, “A Serpente”.
Nelson
Rodrigues morreu em 21 de Dezembro de 1980, após sete paradas cardíacas, aos 68
anos, de trombose, insuficiência cardíaca e respiratória. Foi enterrado com a
bandeira do Fluminense, seu time de coração. Deixou seis filhos: Joffre,
Nelson, Maria Lucia, Paulo César, Sonia e Daniela. Sua obra engloba 17 peças,
16 livros, 3 novelas para TV (e outras adaptações) e 22 filmes.
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