terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Apesar de polêmica, guarda compartilhada é considerada um avanço por pais e especialistas

A aprovação no Senado, na quarta-feira (26), do projeto que prioriza a guarda compartilhada teve grande repercussão e gerou debates nas redes sociais. A proposta, que deverá ser sancionada pela Presidência da República e virar lei, determina aos juízes que estabeleçam o compartilhamento obrigatório da custódia dos filhos se não houver acordo entre os pais divorciados.

Entre as opiniões favoráveis destaca-se a das pessoas que apoiam a lei por entender que os filhos são atendidos no direito ao convívio com o pai e a mãe separados. Já as reações contrárias consideram a proposta uma intromissão nas decisões da família, com prejuízos para o desenvolvimento dos filhos, que receberiam orientações de dois lares diferentes sobre valores morais, éticos e, em alguns casos, religiosos. Além disso, não se levaria em conta a vontade dos filhos de conviver ou não com um dos pais.

O que também pode pesar para a divergência entre os pais no compartilhamento da responsabilidade é a exigência da prestação de contas, segundo a advogada especializada em Direto de Família e Sucessões, Priscila Corrêa da Fonseca. Ela avalia que a cobrança virá porque o projeto se refere a assuntos ou situações que afetam direta ou indiretamente a saúde e a educação dos filhos, além da divisão do tempo que a mãe e o pai terão com a criança.

— Por outro lado, é positiva essa divisão de responsabilidade e também a facilitação para acesso às informações dos filhos em instituições de ensino, médicos, entre outros — analisa.

Divórcio
 A aprovação da guarda compartilhada foi comemorada pela Associação de Pais e Mães Separados (Apase).  Para o presidente da entidade, Analdino Paulino Neto, a lei vai acabar com as disputas prolongadas e permitir a mães e pais contribuírem igualmente para a formação dos filhos. Ele prevê a substituição da pensão alimentícia por um mecanismo mais avançado: a divisão das despesas dos filhos por meio de uma planilha de gastos a ser bancada pelos pais de maneira proporcional à renda.

Segundo dados do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2000 até 2010, as separações aumentaram cerca de 20%. De acordo com as Estatísticas do Registro Civil, o país registrou em 2011 a maior taxa de divórcios desde 1984, chegando a 351.153, um crescimento de 45,6% em relação ao ano anterior. Em 2012, a responsabilidade pelos filhos foi delegada às mulheres em 87,1% dos divórcios concedidos no Brasil contra 6% que tiveram a guarda compartilhada.

No entendimento da psicóloga Ely Harasawa, gerente de Programas da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, especializada em Educação Infantil na Universidade de Niigata (Japão), a aprovação da guarda compartilhada reflete a preocupação da sociedade em garantir espaço para que o pai também possa exercer seu papel na criação e no desenvolvimento dos filhos.

— Mas é importante que a guarda compartilhada não se transforme em motivo para conflitos e disputas entre os pais que possam prejudicar os filhos. Quanto menor é a criança, mais ela precisa se sentir segura e vivendo em um ambiente de harmonia — pondera a profissional que trabalha em defesa da primeira infância.

A lei obteve um apoio importante, o da avó de Bernardo Uglione Boldrini (e dos advogados dela, que leram o projeto). O menino de 11 anos foi encontrado morto em abril deste ano em um matagal no Rio Grande do Sul. Ele foi assassinado com uma injeção letal e os principais suspeitos do crime são o pai e a madrasta.

Para o relator do projeto na Comissão de Assuntos Sociais (CAS), senador Jayme Campos (DEM-MT), o texto previne que os filhos virem objeto de disputa entre os pais. E virem vítimas, muitas vezes, de manipulação emocional, violência física e até de morte. Ele recordou o caso do assassinato de Isabella Nardoni, de cinco anos. O pai e a madrasta foram condenados pela morte da criança, jogada do sexto andar de um prédio em São Paulo, em 2008.

Tramitação
 O projeto (PLC 117/2013), do Deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), tramitou por três anos na Câmara dos Deputados até ser aprovado e enviado ao Senado em dezembro de 2013.

Depois de ser analisada nas Comissões de Direitos Humanos (CDH), de Constituição e Justiça (CCJ) e de Assuntos Sociais (CAS), a proposta foi aprovada como veio da Câmara, com o objetivo de regulamentar o tema, já previsto no Código Civil. O artigo 1.583 define a guarda compartilhada como “a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto”.

O autor argumentou que a redação atual da lei induz os juízes a decretar a guarda compartilhada apenas nos casos em que haja boa relação entre os pais após o divórcio. No entanto, para o deputado, o uso seria mais necessário justamente nos casos de desacordo entre os pais.

Um dos objetivos da proposta foi evitar a alienação parental, que ocorre quando o responsável pela criança acaba alienando o ex-companheiro ou a ex-companheira da convivência com os filhos, gerando desgaste para a família e prejuízos emocionais, psíquicos e intelectuais para crianças e adolescentes.

O projeto determinou que, em caso de conflito entre mãe e pai quanto à guarda do filho, se os dois estiverem aptos a exercer o poder familiar, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada. A única exceção será quando um dos pais declarar ao juiz que não deseja a guarda do filho.

Pelo texto aprovado, ficou estabelecido que a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses deles. Também foi prevista a divisão equilibrada do tempo de convivência com a mãe e o pai. Estabelecimentos, como escolas, que se negarem a dar informações a qualquer dos pais sobre os filhos serão multados em R$ 200 a R$ 500 por dia pelo não atendimento da solicitação.

Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.

Entenda a proposta
O projeto           
Em caso de conflito entre mãe e pai separados, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada.

Convivência      
O tempo de convivência dos filhos com o pai e a mãe será dividido de forma equilibrada.

Moradia             
A cidade de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses deles.

Autoridade       
Ambos poderão autorizar ou negar o consentimento aos filhos para viagem ao exterior ou mudança para outro município.

Medida cautelar             
Os pais serão ouvidos pelo juiz para decidir sobre a guarda.

Informações     
Estabelecimentos, como escolas, que negarem informações dos filhos a qualquer um dos pais serão multados em R$ 200 a R$ 500 por dia.

Pais inaptos      
O juiz deferirá a guarda a terceira pessoa, considerando o grau de parentesco e as relações de afinidade e afetividade.

Agência Senado 

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