“Uma monitora se aproximou e me informou que
eu não podia amamentar lá, tentei discutir, mas fiquei constrangida e não sabia
o que dizer para me defender, mesmo conhecendo casos similares. Senti-me suja e
envergonhada por ter atraído a atenção das outras pessoas que estavam lá”. O
relato é da modelo Priscila Bueno, mãe de Julieta, de 1 ano e 9 meses, e
ocorreu quando ela visitava, em fevereiro do ano passado, uma exposição no
Museu da Imagem e do Som, na capital paulista. Foram denúncias como essa que
resultaram na aprovação de uma lei municipal, sancionada terça-feira (14), que
estabelece multa aos estabelecimentos que proibirem ou causarem constrangimento
à amamentação.
Em caso de descumprimento,
estabelecimentos comerciais, culturais, recreativos ou de prestação de serviço
estão sujeitos à multa de R$ 500. Isso ocorre independentemente de existir
áreas destinadas à amamentação. Em caso de reincidência, a multa é duplicada. O
projeto de lei foi formulado em dezembro de 2013, um mês depois de ter sido
registrado outro caso de constrangimento, desta vez no Serviço Social do
Comércio (Sesc) Belenzinho. A turismóloga Geovana Cleres foi abordada por
funcionários da unidade enquanto amamentava a filha. O fato gerou um mamaço,
evento promovido no mesmo local em que o fato ocorreu, em que as mães amamentam
os filhos e debatem a importância do aleitamento.
Para a integrante da organização
não governamental Sempreviva Organização Feminista Maria Fernanda Marcelino, os
valores machistas da sociedade tornam necessárias leis para situações que
deveriam ser naturais. “Considerando que a amamentação é ato fundamental para a
vida, é um absurdo que um espaço atue no sentido de proibir, constranger as
mulheres que estão amamentando”. Ela avalia que isso tem relação com tentativas
de confinar as mulheres no espaço privado. “Quando uma mulher sai de casa e tem
filho pequeno, ela tem direito, portanto, ao espaço público e a amamentar seu
filho onde quer que esteja”, defendeu.
Priscila conta que, após o
constrangimento no Museu da Imagem e do Som, passou a ter medo de ser abordada
novamente. “[Isso] faz com que a mulher se sinta inadequada por fazer algo
natural e ela pode deixar de amamentar ou não respeitar a livre demanda [do
bebê]. Em alguns casos, passar por uma situação humilhante dessas pode diminuir
a produção de leite”, declarou ao comentar os prejuízos que esse tipo de
prática pode provocar às mães e aos bebês. Ela critica esses estabelecimentos
que veem a amamentação como um ato obsceno.
Maria Fernanda avalia que existe
uma hipocrisia em relação à nudez na sociedade, em especial das mulheres. “Nas
propagandas, na televisão, em qualquer horário, é possível ver mulheres nuas,
então por que os seios de uma mulher amamentando incomodam? Por um lado, se
explora o corpo feminino para a venda de produtos, e para algo que é natural,
não se pode expor. É uma sociedade baseada na hipocrisia”, argumentou. Ela
acrescenta que a lei, no caso de São Paulo, pode ajudar as mulheres a viverem a
maternidade em equilíbrio com o mundo do trabalho e com a vida na sociedade.
É o que espera a babá Maria José
dos Santos, de 39 anos, grávida de um menino. “Soube ontem que agora há essa
lei. Eu nem sabia que tinha locais que faziam isso. Achei boa a lei. Não há
nada demais em amamentar, é uma coisa que tinha que ser incentivada”, declarou.
Mãe de primeira viagem, ela ainda tem dúvidas sobre a amamentação, mas não
vacila em dizer que alimentará o filho sempre que necessário. “Na hora da fome,
nem vou pensar em vergonha, em qualquer lugar vou amamentar.”
Por meio da assessoria de
imprensa, o Museu da Imagem e do Som disse que a atitude do funcionário que
abordou Priscila não condiz com o posicionamento da instituição. “Os
colaboradores envolvidos passaram por novo treinamento para que o fato não
ocorra novamente. Também reforçamos com os demais funcionários que mães que
visitam o museu têm total liberdade de amamentar seus filhos no espaço
expositivo”, acrescenta a nota.
O Sesc Belenzinho negou que tenha
havido o episódio de impedimento ao aleitamento materno na unidade.
"Esclarecemos que, na ocasião, apuramos o ocorrido e verificamos que se
tratou de uma falha de comunicação por parte de uma funcionária ainda em fase
de treinamento. Informação que foi corrigida, na sequência, por uma segunda
funcionária”, diz o texto enviado pela assessoria de imprensa. A instituição
ressaltou que o mamaço, promovido na unidade em 2013 foi acolhido e
“transcorreu com tranquilidade no espaço de convivência”.
Agência Brasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário