Do O Globo
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RIO e
RECIFE - O aluno não aprende porque os pais não o acompanham? Para 88% dos
professores do nível fundamental da rede pública no país, sim. Quase 81% também
acreditam que um aluno não vai bem na escola porque não se esforça. Os dados
fazem parte de um levantamento feito pelo Movimento Todos Pela Educação em
respostas dadas por professores da rede pública na Prova Brasil, do Inep. E
levantam a questão: num sistema educacional público com má remuneração para o
magistério e escolas mal equipadas, que recebem estudantes em que a própria
família já tem, em geral, baixa escolaridade e frágil nível cultural, de quem é
a culpa pelo mau aluno?
No
Questionário do Professor da Prova Brasil de 2009, os professores receberam uma
lista de possíveis causas para problemas de aprendizagem dos estudantes, para
dizer com quais causas mais concordavam. Quase todos concordaram com as
respostas "Falta de assistência e acompanhamento da família nos deveres de
casa e pesquisas do aluno" e "Desinteresse e falta de esforço do
aluno". Respostas que poderiam mostrar a responsabilidade do professor ou
da escola — "Baixo salário dos professores, que gera insatisfação e
desestímulo para a atividade docente" e "Escola oferece poucas
oportunidades de desenvolvimento do aluno" — tiveram 30,5% e 27,4%,
respectivamente.
— Como a
educação depende de vários setores, é esperado que um jogue a responsabilidade
para o outro. Se você for perguntar para muitos pais, eles vão dizer que a
escola não ensina direito. Mas, apesar de esperada essa responsabilização do
outro, é preocupante que o professor coloque a culpa na família, se pensarmos
que, nas escolas públicas, em diversas vezes não lidamos com crianças imersas
no mundo letrado. Jogar a culpa para a família, nesses casos, é o professor
falar "não consigo lutar contra isso". Nesse tipo de realidade, a
função da escola pública é essa mesmo, é exercer um papel que a família e o meio
em que o aluno vive não estão conseguindo cumprir. O contrário seria condenar a
criança pobre a não aprender — analisa Priscila Cruz, diretora-executiva do
Todos Pela Educação.
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NOVAS FORMAS DE PARTICIPAÇÃO
Se a
família não consegue acompanhar a educação do aluno, diz Priscila, o papel da
escola seria achar maneiras de estimular esse acompanhamento.
— Não
podemos partir da suposição de que a família não apoia porque não quer. Às
vezes é porque não sabe mesmo, em muitos casos os pais estudaram menos do que o
filho. Além disso, a escola reclama que os pais não vão às reuniões, mas as
marca na terça às 9h. A classe trabalhadora trabalha na terça às 9h — destaca
Priscila, para quem o baixo número de respostas de professores colocando a
responsabilidade no nível salarial e no desestímulo que isso provoca também era
esperado. — Seria até antiético, eles estariam admitindo que dão uma aula ruim.
Em áreas
com indicadores sociais críticos, como Norte e Nordeste, a falta de
acompanhamento da família às vezes tem a ver com problemas como o
analfabetismo.
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MUDAR A FORMA DE PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA PARECE SER A
SAÍDA, AFIRMAM OS PESQUISADORES
— Nas séries iniciais, acredito que a
responsabilidade maior pela educação da criança seja da escola, porque são
alunos mais interessados. A partir da adolescência, o interesse da família em
acompanhar ganha um peso maior. Agora, é mais fácil culpar os pais, quando a
leitura correta é: como a escola pode mudar para conquistar esses pais? — diz
João Batista Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto. — A escola trata o
pai mal, só fala mal do filho. O pai não volta a segunda vez. Quando a escola
poderia, em vez disso, falar sobre o que o filho tem de bom. Se o aluno picha,
como converter aquilo num trabalho com artes, por exemplo. Em vez de chamar o
pai só para reuniões, chamá-lo para falar de cursos para esse pai.
— A família
de aluno de rede pública em geral participa pouco. O problema são as condições
de participação, que afetam a qualidade dela. A escola tem de melhorá-las —
afirma Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. —
Estudos mostram que o chamado efeito-família tem peso similar no aprendizado ao
do efeito-escola. Mas, no Brasil, o efeito-família tem um obstáculo, a baixa
escolaridade de boa parte das famílias. Aí, a escola é que tem de ser a
diferença.
QUANDO O FILHO EXPLICA O DEVER
A resposta "Carência de infraestrutura
física e pedagógica da escola" recebeu apenas 28% da concordância dos
professores no levantamento da Prova Brasil. Mas, para Danilo Serafim,
professor de Sociologia da rede estadual do Rio e coordenador geral do
Sindicato dos Professores do Estado do Rio (Sepe), esse é um dos principais
itens que demonstram que o culpado não é nem o pai nem o professor:
— É o
sistema educacional. As políticas educacionais, que não põem contraturno nas
escolas, laboratórios... Estive numa escola de Valença recentemente, e, quando
chove, o professor tem de levar os alunos para o banheiro, o único lugar onde
não chove lá dentro. É claro que há diferença do aluno de uma família que
participa para um que tem família ausente. Mas estou perplexo com o fato de a
maioria dos professores ter respondido que a causa está nos pais. Se o
professor ficar apontando dedo para a família, e a família, para o professor,
os reais responsáveis só vão ficar assistindo a isso de camarote.
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