Do Diário de Pernambuco, por Paulo de Tarso Lyra
imagem: diariodepernambuco.com.br |
Com 81 anos
recém completados, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comemora os 18
anos do Plano Real neste 1º de julho de 2012. Lembra das dificuldades em
promover as mudanças, não apenas de moeda, mas também de cultura, imprimindo um
profundo ajuste fiscal, cortes no orçamento e fechamento de bancos públicos,
considerados como ralos de escoamento de dinheiro.
Nesta
entrevista exclusiva, FHC afirmou que a Europa está sem saída a curto prazo
porque não consegue investir e não adotou medidas de ajustes fiscais. Disse que
o Brasil, mesmo nos momentos de crise mais aguda, jamais entrou em recessão.
“Nós fizemos a estabilização junto com condições para que a economia não
morresse afogada. A Europa está se afogando”.
Apesar de
elogiar a presidente Dilma Rousseff, FHC afirma que o país não vive um ciclo de
desenvolvimento sustentável. “Precisamos investir em infraestrutura, priorizar
a educação, dar mais segurança jurídica às pessoas e definir o que fazer com
energia e o meio ambiente”.
Após 18 anos de implantação do Plano
Real, o país e a economia brasileira estão mais maduros do que em 1994?
Atingimos a maioridade?
Em relação
ao que éramos eu não tenho nenhuma dúvida. É preciso tomar cuidado porque, em
alguns países, a maioridade só se consegue aos 21 anos de idade. Mas estamos
mais seguros.
Que sinais de segurança o país
transmite? E quais de insegurança?
O Plano
Real, estrito senso, era um plano para controlar a inflação e estabilizar a
moeda. Mas foram necessárias também uma série de outras medidas para assegurar
a estabilidade da moeda. O nosso programa atravessou muitas intempéries.
Mudanças de governo, inclusive com, formalmente, ideias que não seriam as
mesmas das nossas. Mostramos que a força do plano era tal que obrigou a uma
certa continuidade.
O que pode ser aperfeiçoado no
Plano?
Nosso
objetivo era controlar a inflação e por em ordem as contas públicas. Elas ainda
não estão completamente em ordem, temos uma dívida interna muito grande, mas
sob controle. Aprendemos a lidar com a taxa de câmbio, que era rígida e passou
a ser flutuante. Engessamos o gasto com a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Qual o desafio atual?
Manter isso
e fazer crescer a economia. Não está claro ainda que nós tenhamos um
crescimento sustentável da economia.
Por quê?
Vários
fatores. De 2004 até 2008, 2009, o fator externo foi favorável. A partir daí,
começamos a enfrentar dificuldades. Quais são as dificuldades? A primeira diz
respeito à nossa taxa de poupança e de investimentos, que são baixas. É preciso
priorizar educação de boa qualidade. Dar garantias jurídicas às pessoas. Nesse
aspecto, ainda temos muito o que fazer.
E a infraestrutura?
Ainda não
crescemos os investimentos em infraestrutura. O dinamismo da economia fica
apertado por esse gargalo. Não temos uma visão estratégica de para que lado nós
vamos na questão da energia, como vamos ajustar as demandas de crescimento com
meio ambiente.
O senhor tem elogiado a presidente
Dilma Rousseff. Enxerga disposição para fazer as mudanças econômicas
necessárias?
Houve um
avanço em relação à questão da Previdência Social (Funpresp). Em relação às
outras questões, ainda estamos esperando para ver o que vai acontecer. Eu não
vejo com clareza qual será o rumo. A presidente está tentando arrumar a casa
das desordens produzidas pelo governo anterior.
Muitas das reformas começaram
durante o governo Itamar Franco. Aqueles dias conturbados serviram para
fomentar o caldo reformista?
As reformas
mesmo vieram depois – da previdência, do sistema bancário, as questões
estruturais. O clima para mudança surgiu no governo Itamar porque nós estávamos
sufocados pela hiperinflação, tínhamos que sobreviver.
Quais os erros cometidos pela Europa
na crise do Euro?
Uma coisa
foi o Plano Real com troca de moeda, URV. Por trás disso, houve uma reconstrução
das finanças públicas e do sistema financeiro bancário. Nós pegamos todas as
dívidas dos estados, consolidamos, assumimos tudo. Proibimos os estados de
contraírem mais dívidas sem a autorização do Senado. Fechamos muitos bancos
estaduais que eram um ralo para gastar dinheiro.
Nada disso foi feito pelos europeus?
A Europa
não pode fazer isto até agora porque ela tem uma moeda única, mas tem políticas
fiscais variadas, cada país tem a sua. No começo, alguns acordos limitavam o
poder de endividamento dos países, mas era algo voluntário.
Mas o Real também enfrentou crises.
Nós tivemos
uma crise financeira aqui em 1995, com a quebradeira dos bancos. A partir daí,
o Banco Central colocou regras, começamos a seguir as regras da Basiléia, que
os europeus estão começando a falar agora. Nossos bancos não são alavancados.
Nossa política não foi só de reformar, mas de respeitar regras. A Europa não
fez nem uma coisa nem outra.
O senhor enxerga saída para a crise
europeia a curto prazo?
Não. Saída
mesmo é retomada do crescimento. Isso requer retomada de investimentos. Mas
leva tempo. Nós nunca deixamos de ter crescimento. Pequeno, mas tivemos, nunca
mergulhamos na depressão. Nós fizemos a estabilização junto com condições para
que a economia não morresse afogada. A Europa está se afogando.
Quando vocês começaram a elaborar o
Plano Real, tinham noção de que aquele plano seria praticamente definitivo no
combate à inflação?
Nós
tínhamos um compromisso muito forte de implementar as medidas necessárias para
acabar com a inflação. Se íamos conseguir ou não, era difícil saber. Muita
gente era contra. Ou contra ativamente ou contra por inércia. Tivemos que fazer
um ajuste fiscal, cortei 50% do Orçamento. Não tínhamos certeza se teríamos
condições políticas para implementar isso.
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