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por Walcyr Carrasco
Sempre me espanto com a pressa dos outros. Vivo na ponte
aérea Rio-São Paulo. Quando o voo é anunciado, é o estouro da boiada. Os
passageiros correm em busca dos primeiros lugares na fila. Quem tem prioridade
amontoa-se na frente. Já presenciei uma senhora com um filho pequeno ser
expelida para fora da área VIP por um bando de executivos de terno e gravata,
certamente preferenciais por milhagem.
Impossível entender tanta pressa no embarque. O lugar
está marcado. Todo mundo vai sentar. Até para acomodar a bagagem de mão tenho
problemas. Outro dia, uma senhora volumosa recusou-se a esperar enquanto eu
botava a maleta lá em cima. E me amassou no corredor estreito. Quase derrubei a
mala em sua cabeça.
Quando o avião
aterrissa, é pior que incêndio. Todos querem sair o mais rápido possível. Se
estou no corredor, o passageiro do meu lado levanta-se e fica curvado, à espera
de que eu abra caminho. A essas alturas, iniciou-se um empurra-empurra no
corredor. Pegar minha bagagem é uma façanha. Desembarcar é mais fácil: os que
estão atrás me atiram em direção à saída. E depois passam por mim correndo em
direção à escada rolante. No avião, o povo já esqueceu a cortesia.
Já aconteceu comigo e outros amigos. O veículo de trás
buzina quando a gente para no sinal vermelho! Depois o motorista xinga quando
ultrapassa, como se o errado fosse eu! A estrada para o Litoral Norte de São
Paulo tem só uma pista de cada lado. A velocidade é bem sinalizada,
considerando as curvas, subidas, descidas. Adianta? Se sigo as placas, alguém
cola atrás, me atiça para correr. Dá até medo! Diz um sábio, amigo meu:
– Trânsito é igual a capitalismo selvagem. Todo mundo
quer passar por cima do outro.
Fui para a Bahia, no lançamento da minha novela Gabriela,
inspirada no livro de Jorge Amado. Encontrei com outro escritor no final da tarde.
Ele estava lá havia um dia. Relatou:
– Fui ao Pelourinho, à Igreja do Carmo, à dos Negros, à
exposição da casa de Benin, à Fundação Casa de Jorge Amado, vi o acervo, olhei
a casa da Gal Costa que agora vendeu e vai ser um hotel de charme, a do Caetano,
conheci uma mãe de santo que me leu os búzios e disse que terei muito sucesso,
almocei uma moqueca num restaurante típico, passeei na praia, conheci o Mercado
Modelo, fui no trapiche, comi um acarajé que dizem que é o melhor daqui...
Já viajei assim, que arrependimento! Certa vez fui à
Grécia com um grupo de amigos. Chegamos de noite em Santorini. Disparamos para
os penhascos de manhã, observamos rapidamente os restos das construções de
antigos espartanos, passamos pelas vitrines das lojas de suvenires sem tempo
para entrar, voamos até as praias só para ver, sem poder mergulhar por causa da
agenda, não almoçamos por falta de tempo e desmaiamos cedo nas camas para
acordar às 4 da manhã e pegar um voo para Rodes, com conexão em Atenas.
Repetimos a correria ilha após ilha.
E os executivos?
Tenho um amigo que marca dois, três almoços de negócio por dia. Come um pouco
em cada um. Está tratando da úlcera. E o que é pior, com tanta pressa, dá para
resolver alguma coisa?
Já vi um sujeito
se comportando como um boi furioso simplesmente porque uma senhora andava
devagar a sua frente, no corredor do shopping. Esbarrou nela ao ultrapassá-la
rapidamente. Gastar uns minutos a mais, que diferença faz?
Todo mundo parece
tão apressado que às vezes também sou compelido a resolver as coisas
velozmente. Mas faço um esforço para me acalmar.
Até hoje me
arrependo da pressa na Grécia. Não conheci o povo, não me dei tempo para
simplesmente desfrutar a viagem. Melhor seria ter ido para menos lugares.
Quando vejo esses roteiros turísticos prometendo a Europa em 20 dias, dá uma
preguiça!
Nada é tão urgente
que não possa esperar mais um pouco, penso eu. Ceder passagem a alguém, segurar
a porta do elevador... Pequenas gentilezas criam um astral melhor, fazem com
que a gente troque sorrisos. O maior beneficiado sou eu mesmo. A vida merece
que a gente tenha tempo para ela.
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