Do Diário de Pernambuco
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imagem: janeayresouto.com.br |
A educação
é a chave do crescimento econômico das nações. Com o Brasil não é diferente.
Sétima economia do mundo, o país tem que fazer o dever de casa do ensino básico
para dar o salto de qualidade na formação de mão de obra. Começa nos anos
iniciais do pré-escolar, onde é sedimentada a base do conhecimento. Nesse
contexto, o professor é a peça fundamental para fazer a revolução da educação. A mudança passa pela reformulação dos currículos dos cursos de
licenciatura, pedagogia e letras. Menos teoria e mais prática de ensino.
Nesta
entrevista exclusiva, o professor Mozart Neves Ramos, membro do Conselho
Consultivo do movimento Todos pela Educação, aponta os caminhos para o resgate
da escola pública através da valorização do magistério, de melhores salários e
investimentos públicos na educação. Ele cobra das universidades a participação
efetiva dos mestres na formação dos alunos das escolas públicas, que têm nas
mãos a responsabilidade de ensinar os futuros professores.
Como a formação do
professor interfere na formação do aluno?
A qualidade
da aprendizagem está essencialmente vinculada à qualidade de formação do
professor. O que a gente observa hoje no Brasil, e os estudos mostram
claramente, é que a formação do professor está muito aquém do necessário para
que o desempenho do aluno seja alcançado. Ou seja, o rofessor hoje recebe uma
formação que não está dentro da realidade da escola pública.
Qual o papel da
universidade na formação do professor e na qualidade do ensino?
A educação
básica, infelizmente, não está na agenda de prioridades da universidade. Esse
distanciamento tem levado a uma formação que não se coaduna com os desafios da
escola pública. Consequentemente, a formação não está sendo apropriada. Quando
o professor vai para a prática do ensino e para a realidade em sala de aula,
existe um grande vazio entre a universidade e a educação básica. Para garantir
o bom desempenho do aluno em sala de aula, a gente tem que assegurar uma boa
formação dos nossos professores.
Existem exemplos de
países que conseguiram formar bem o professor?
Os países
hoje no topo da educação básica são: Coreia do Sul, Finlândia e Cingapura.
Esses países conseguiram chegar nesse estágio de liderança porque apostaram
fortemente na valorização do professor. Nesses países você seleciona os
melhores alunos do ensino médio. Os mais bem capacitados e formados no ensino
médio é que lutam ardentemente para ingressar na carreira do magistério. No
Brasil a gente tem o inverso. Em geral os alunos mais fracos, que tiveram mais
dificuldade de aprendizado no ensino médio, é que vão para as licenciaturas.
A boa formação do
professor resolve o problema da educação?
Não. Em
primeiro lugar tem o salário inicial atraente. O salário dos professores nesses
países é comparável ao do médico e do advogado em início de carreira. É um
salário competitivo às carreiras mais valorizadas. O segundo ponto é ter uma
carreira promissora ao longo da vida para garantir a ermanência do professor em
sala de aula, uma carreira pautada pelo mérito do professor. O terceiro ponto é
a formação inicial. Na Finlândia, por exemplo, s alunos, além dos anos
vinculados à carreira do magistério, passam por uma espécie de residência
docente, como se tem na medicina. Eles são preparados previamente antes de irem
para sala de aula.
Como sair dessa
encruzilhada no Brasil?
Não basta
ter diagnóstico. Em primeiro lugar, a gente tem que ter a consciência que não
vai poder abdicar dos atuais professores porque eles stão no processo. Foi
assim que historicamente o Brasil construiu a sua formação docente. A gente vai
ter que fazer duas ações que mais adiante vão e coadunar. Tem que ter um
salário inicial atraente para conseguir atrair os melhores. Se a gente está
pensando num melhor professor, ele seria recrutado partir dos melhores alunos
do ensino médio, com outro salário e outra carreira. Esses novos professores já
começariam a fazer parte desse novo sistema onde você certificaria as escolas e
o professor com uma boa formação e um salário inicial, e uma carreira
promissora. Aí você começa a mudar o pneu.
Como ficam os
professores que estão hoje no batente?
A gente
deveria criar uma ponte de migração para o novo sistema. Eu acho que a gente
poderia certificar os atuais professores que estão com a mão na massa, que se
submeteriam a uma prova e, passando, migrariam para a nova carreira. Ao mesmo
tempo o estado promoveria cursos para esses professores que não se sentem
devidamente preparados para essa certificação.
Esse sistema de
certificação garantirá a qualidade do ensino?
A minha
proposta é que nessa ponte entre os dois sistemas, ao invés de ser mais uma
especialização, esses professores poderiam entrar numa escola de formação preparatória
para fazer a migração. Se ele passar, é o professor que tem as condições
básicas para a nova educação, para a educação que a gente espera.
Os recursos investidos
hoje em educação no Brasil são satisfatórios?
O que a
gente investe hoje por aluno na educação básica é muito pouco:R$ 2.942. Nesses
países que me referi, se a gente transforma de dólar para real, eles investem
US$ 6 mil (R$ 10 mil). O per capita por aluno é de R$ 10 mil nesses países. O
Brasil vai ter que fazer um esforço para pelo menos dobrar o que é investido
hoje na educação básica.
Colocar mais dinheiro
na educação resolve o problema?
Não é
simplesmente dobrar os recursos para fazer calçada na frente da escola, salas
ou outras coisas. Esse dinheiro deve estar vinculado à nova formação do
docente, e para trazer o jovem da escola de ensino médio para a carreira de
magistério. Eu, ministro da Educação, colocaria todo o meu dinheiro para esse
sentimento de atração à carreira do magistério. Se não fizer isso, não vai
resolver o problema da aprendizagem.
Como estão os
currículos dos cursos de licenciatura das universidades?
A minha
opinião é que a gente vai ter que pensar e repensar a universidade. O grande
desafio brasileiro hoje é formar professores para a educação básica. E as universidades
vão ter que reformular os seus currículos com base em estudos que apontam que
hoje se fala das questões sociológicas e filosóficas da educação, e não se fala
da prática de ensino. Eu promoveria uma grande mudança na formação e no
currículo. Temos que resolver algo fundamental nesse país chamado gente. Gente
qualificada, gente motivada, gente bem formada.
Como seriam esses
novos currículos?
Deve haver
uma grande ação suprapartidária para que o novo currículo não tenha viés
partidário e conte com a colaboração de grandes especialistas externos. Aí se
faria um grande pacto pela educação brasileira, para ter um currículo
minimamente nacional e não engessado. Até porque as características e um
professor que ensina na Amazônia podem não ser a mesmas de um professor que
ensina em Pernambuco ou em São Paulo. E, por fim, tem que ter novo modelo de
gestão porque senão na primeira chuva esse dinheiro vira lama.
A realidade da
educação no Nordeste é diferente do Sudeste e do Sul do país?
A questão
hoje no Brasil é a formação do professor. No nível superior você observa que há
uma defasagem de currículos do Iapoque ao Chuí. São currículos totalmente
desconectados da realidade da escola pública. Vai ter que trazer para dentro
das universidades uma agenda de prioridades para a educação básica. Os
professores têm que conhecer a escola pública. Os professores que publicam
papers em revistas para receber os apoios financeiros têm que dar uma
colaboração para a educação básica. Têm que conhecer a escola pública, participar
da formação dos professores.
Como atrair esses
professores com mestrado e doutorado para dentro da escola pública?
Eu gostaria
muito de ouvir a opinião das universidades. Eu sou professor da graduação e da
pós-graduação. Portanto, eu formo aquele que vai ser o meu futuro colega na
universidade. Na rede pública tem vários professores com mestrado e com
doutorado. Nós deveríamos incorporar um percentual de professores que têm
titulação dada pelas universidades para eles atuarem na formação dos futuros
professores. Traria para os currículos o sotaque da escola pública. A maioria
dos meus colegas de química, por exemplo, nunca entrou numa escola pública,
porque foram formados numa escola particular de ensino médio. Eu acho que uma
forma de garantir essa integração é assegurar a participação dos professores
que estão na rede pública com doutorado e com mestrado, que são considerados
bons professores, e poderiam trazer essa colaboração para o curso superior.
Como estão os índices
de desempenho da educação em Pernambuco?
O estado
vem melhorando, mas entendo que Pernambuco melhora numa velocidade lenta. Onde
está melhorando é no ensino fundamental, nas séries iniciais (português e
matemática), mas os alunos não conseguem manter o mesmo nível quando chegam à
oitava série. Na prática têm uma situação que melhorou, mas as séries finais e
ensino médio é muito grave. A gente está estagnado.
Quem está melhor no
Nordeste?
Quem dá um
salto importante é o Ceará. Na última Prova Brasil foi quem mais avançou. Eles
conseguiram construir um alinhamento político mínimo.
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