Três militares que foram
convocados na manhã de hoje (29) para prestar depoimento na Comissão Nacional
da Verdade (CNV) pediram que a imprensa se retirasse da sala de audiência
pública e, ainda assim, não responderam às perguntas dos membros do colegiado.
Nesta semana, estão previstos depoimentos de 20 militares convocados e de um
convidado no Arquivo Nacional, para tratar de 11 temas como o atentado à bomba
no Riocentro, a Casa da Morte de Petrópolis e a morte do deputado Rubens Paiva.
Tânia Rêgo/Agência Brasil |
O general reformado, Nilton de
Albuquerque Cerqueira, depõe durante mutirão de depoimentos de agentes da
repressão, convocados pela Comissão Nacional da Verdade (CNV)
Na manhã desta terça-feira,
seriam ouvidos o general reformado Nilton de Albuquerque Cerqueira e os
capitães Jacy e Jurandyr Ochsendorf, todos defendidos pelo advogado Rodrigo
Roca, que orientou seus clientes a ficarem em silêncio. "A questão não é
colaborar, nem se defender. É evitar que erros históricos se repitam e acabem
virando uma verdade", disse o advogado, afirmando que a comissão foi
induzida a um "erro histórico" ao divulgar uma foto do acidente em
que morreu a estilista Zuzu Angel, na qual aparece o coronel Freddie Perdigão.
A imagem foi entregue à CNV pelo ex-delegado do Departamento de Ordem Política
e Social (Dops) Claudio Guerra.
"Com esse engano, causou-se
um transtorno muito grande, acredito eu, para os parentes e para os
companheiros de farda [do coronel Perdigão]. Quem declarou isso a Vossa
Excelência, ou se enganou, ou te enganou, que é pior ainda", disse o
advogado ao coordenador da CNV, Pedro Dallari.
Dallari classificou a
justificativa de incoerente: "Se há erro, o erro só pode ser corrigido com
depoimentos, com elementos e com documentos. Não com silêncio. A declaração de
que [o convocado ou convidado] não vai
se manifestar sobre um assunto não ajuda na investigação", disse Dallari.
Ele ressaltou que a foto do acidente foi recebida de uma testemunha de grande
credibilidade, que participou ativamente dos eventos. "Não podemos aceitar
que haja contestação das informações por quem se nega a prestar depoimento,
porque aí seria uma inversão da própria lógica do processo de
investigação."
Apesar de lamentar, o coordenador
da comissão, no entanto, minimizou: "É claro que, para a CNV, seria muito
importante que houvesse mais colaboração, mas eu diria que já temos elementos
suficientes. A fala deles era importante do ponto de vista do direito de
defesa, de eles poderem apresentar a sua versão dos fatos. Para mim, essa
estratégia pode fazer sentido juridicamente, embora, do ponto de vista da
imagem, seja péssima, porque quem fala que não tem nada a declarar em geral é
quem é culpado. Se eles fossem inocentes, apresentariam a sua versão dos
fatos."
O general Nilton Cerqueira
comandava a Polícia Militar do Rio de Janeiro na época do atentado do
Riocentro, em 1981, e há um ofício em seu nome que pede a retirada do
policiamento no dia do show em que ocorreria o atentado. Em outra audiência
pública sobre o caso, a CNV apontou essa estratégia como uma das formas de
contribuir com o clima de terror no episódio, em que a bomba acabou explodindo
no carro com os militares dentro. A participação de Nilton também é apontada no
Araguaia e na Operação Pajuçara, em que foi morto o líder militante Carlos
Lamarca, na Bahia. "Ele esteve relacionado diretamente a esses eventos. É
protagonista de eventos dramáticos da história do Brasil".
Mais de dez perguntas foram
feitas a Nilton, e nenhuma foi respondida. De acordo com a advogada Rosa
Cardoso, integrante da CNV, ele disse apenas que pediu para os jornalista
deixarem o salão porque "a imprensa distorce tudo" e afirmou
"que era um absurdo a comissão investigar o fato 30 anos depois".
Tânia Rêgo/Agência Brasil |
Jurandyr Ochsendorf é ouvido
durante mutirão de depoimentos de agentes da repressão durante a ditadura
militar, convocados pela Comissão Nacional da Verdade. O capitão Jurandyr, acusado de
participar da farsa sobre a morte de
Paiva Tânia Rêgo/Agência Brasil
Os irmãos Jacy e Jurandyr são
apontados como participantes da farsa montada para sustentar a versão de que o
deputado Rubens Paiva foi resgatado por guerrilheiros e fugiu, encobrindo o
fato de ter sido torturado e morto. "Estavam vinculados ao DOI-Codi e
participaram diretamente da operação de simulação da fuga de Rubens Paiva.
Depois, a comissão apurou que Rubens Paiva não fugiu, foi executado no
DOI-Codi, e o que se fez foi forjar a fuga do parlamentar. Os capitães Jacy e
Jurandyr tiveram participação direta no evento, como foi relatado por um colega
deles."
Antes do depoimento de Jurandyr,
membros da CNV chegaram a insistir que ele falasse, e, se não fosse falar, que
a imprensa pudesse acompanhar as
perguntas. Em resposta, o militar respondeu apenas que "permaneceria
calado" e que "preferia a ausência da imprensa". O jurista João
Paulo Cavalcanti Filho, que pediu a permanência da imprensa, classificou a
posição de uma "deselegância", já que os jornalistas tiveram que sair
do salão no início de cada depoimento. Cinegrafistas e fotógrafos foram
impedidos pela segurança de fazer imagens do embarque dos dois últimos
depoentes, Jacy e Jurandyr, em carros no pátio interno do Arquivo Nacional.
Agência Brasil
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